Desde o início de seu pontificado, o Papa Francisco vem convocando a Igreja a uma «saída missionária». Esse dinamismo impulsiona a comunidade eclesial principalmente a «sair da própria comodidade e a ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho».[1] Por isso, entre uma Igreja acidentada que sai pelas estradas e uma Igreja doente de autorreferencialidade, Francisco não hesita em preferir a primeira. Entre estas estradas estão também as digitais, congestionadas de humanidade, muitas vezes ferida: homens e mulheres que procuram a salvação e a esperança.
Presença e critérios no ambiente digital
Para estar presente no digital, é preciso muito cuidado, pois critérios para avaliar a missão da Igreja no ambiente digital não devem ser derivados do campo empresarial, político, publicitário, mercadológico ou do entretenimento. Métricas digitais como alcance, engajamento, cliques e visualizações podem ser critérios muito importantes para qualquer outra instituição social, mas dizem muito pouco à Igreja do ponto de vista de sua missão. Os números não importam para a Igreja, porque a «matemática de Deus» é diferente, já que a multiplicação só ocorre quando há fração e partilha.[2] Jesus mesmo nunca perguntou «Quantos homens seguem o Filho do Homem?», mas sim «Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?» (Mateus 16,13).
Missão ou “influência digital”?
Paradoxalmente, percebe-se que é possível ser um influenciador digital de inspiração católica sem ser um evangelizador ou missionário digital. Um evangelizador digital, como discípulo-missionário de Jesus de Nazaré na cultura contemporânea, de fato, é chamado a ser um «anti/contra-influenciador digital»: se a influência digital – como fenômeno sociocultural contemporâneo – exige seguir certos padrões e práticas estipulados pelo mercado da comunicação e pelas empresas detentoras das plataformas digitais (autorreferencialidade, visibilidade, engajamento, concorrência, publicidade, monetização, polemização, polarização…), um missionário digital age em sentido contrário e contracultural.
«É urgente aprender a agir em conjunto, como comunidade, não como indivíduos. Não tanto como ‘influencers individuais’, mas como ‘tecelões de comunhão’: unindo nossos talentos e competências, compartilhando conhecimentos e contribuições».[3] Quem deseja contribuir com um caminho de evangelização integral precisa fazê-lo em comunhão e em comunidade, orientando-se pelos critérios do Evangelho, da Tradição e do Magistério. Assim, projetos de missão digital coletivos são muito mais fiéis ao Evangelho do que os individuais: o próprio Jesus enviou seus discípulos em missão “dois a dois” (Lc 10,1).
A primazia do Evangelho
Um evangelizador digital é chamado a beber da fonte do Evangelho, para que o agir em rede seja coerente com a experiência do amor divino, testemunhando-o e colaborando com a construção do Reino de Deus. «No mundo atual, com a velocidade das comunicações […], a mensagem que anunciamos corre mais do que nunca o risco de aparecer mutilada e reduzida a alguns dos seus aspectos secundários.»[4] Por isso, a missão deve partir do coração do Evangelho: «Neste núcleo fundamental, o que sobressai é a beleza do amor salvífico de Deus manifestado em Jesus Cristo morto e ressuscitado.»[5] A missão da Igreja – e também dos missionários digitais – é auxiliar nessa ação divina e, de preferência, não atrapalhá-la. Neste sentido, é iluminadora a recomendação do «apóstolo da Internet», o jovem Beato Carlo Acutis, que afirmava: «a conversão é um processo de subtração: menos eu para deixar espaço a Deus»[6].
Fonte: Vatican News – trechos do artigo que é assinado pelo Padre Jesuíta Bruno Franguelli, doutorando em Ciências Sociais e Comunicação pela Pontifícia Universidade Gregoriana; e por Moisés Sbardelotto, professor de Teologia prática na Pontifícia Universidade de Minas Gerais, publicado na Revista italiana La Civiltà Cattolica